Marcelo Madarasz |
Bem-humorado, completamente atento às mudanças que ocorrem ao seu redor, uma visão consciente do mercado e objetivo ao seu indagado sobre o que pretende realizar com suas ações profissionais. Essas são apenas algumas das características que, Marcelo Madarasz, gerente de Desenvolvimento de Liderança da Natura, demonstra quando se senta para conversar sobre a trajetória de sua carreira e essência da Gestão de Pessoas.
Segundo o próprio Marcelo afirma, seu propósito como profissional de Gestão de Pessoas é o contribuir para o desenvolvimento das organizações e das pessoas por meio da evolução do nível de consciência. "A área permite esta atuação de forma, às vezes, direta, às vezes, indiretamente, e é muito gratificante você perceber sua contribuição para as pessoas fazerem escolhas coerentes, para a estratégia da empresa ser viabilizada", pondera.
Durante entrevista concedida ao RH.com.br, ele fala sobre como seu ingresso na área foi "curioso", sobre a importância dos gestores que contribuíram para o seu desenvolvimento, as competências que ele considera essenciais para que atua na área, e, logicamente, sobre a paixão que tem pelo trabalho que desempenha na Natura. Conheça um pouco mais sobre Marcelo Madarasz, ao ler a entrevista na íntegra. Até breve!
RH.com.br - Como ocorreu seu ingresso na área de RH?
Marcelo Madarasz - Tenho uma crença que algumas profissões e funções são escolhidas como uma verdadeira missão de vida. Podemos incluir aqui os médicos, os enfermeiros, os assistentes sociais, os psicólogos e os profissionais que, independentemente de sua formação atuam em RH. Atuar em RH é uma espécie de missão. Apesar disto o meu ingresso na área aconteceu de forma curiosa. Tenho formação em psicologia e habilitação para as três áreas: clínica, organizacional e escolar. Durante a formação desde o segundo ano tinha clareza que seguiria a área clínica, tanto que fiz estágio em hospitais psiquiátricos, atuei como acompanhante terapêutico de pacientes psicóticos, fiz formação em psicanálise e investia fortemente em minha preparação profissional. Após a conclusão da faculdade abri meu consultório e como bom recém-formado, eu tinha muito tempo livre (risos). Foi quando recebi um convite para dar aulas de inglês para executivos e acabei aceitando. Quando vi houve uma inversão: a atividade que seria a principal passou a ser a secundária, pois eu tinha muito mais alunos que pacientes. Dei aula durante nove meses para o presidente de uma multinacional francesa,Thomson, que me fez um convite para ingressar em RH. Mesmo explicando a ele que não tinha experiência na área ele me disse que o background clínico seria muito bem-vindo e que ele precisava de alguém com o meu perfil. Aceitei, mantive o consultório por um período, mas depois percebi que havia a necessidade de dedicação muito grande e de iniciar novamente a formação nesta área. Foi o que fiz. É muito importante estar atento aos sinais. Eles são muito importantes. Creio que na vida temos mestres que nos ajudam em nossas trajetórias. O convite deste meu aluno, que passou a ser meu gestor, foi um divisor de águas em minha vida. Tenho muito gratidão a ele.
RH - Quais as razões que o motivaram a se dedicar à Gestão de Pessoas e não atuar em outra área?
Marcelo Madarasz - Parece clichê dizer que para atuar em Gestão de Pessoas você precisa gostar de pessoas, mas apesar de ser um chavão, muitas vezes repetido sem que necessariamente estas palavras venham do coração, eu acredito que seja fundamental você refletir sobre seu propósito de vida e fazer decisões coerentes com este propósito. Eu tenho como propósito contribuir para o desenvolvimento das organizações e das pessoas por meio da evolução do nível de consciência. A área permite esta atuação de forma, às vezes, direta, às vezes, indiretamente, e é muito gratificante você perceber sua contribuição para as pessoas fazerem escolhas coerentes, para a estratégia da empresa ser viabilizada. Afinal, não há outra forma disso acontecer, se não por meio das pessoas. Gestão de Pessoas em seus diferentes processos possibilitam justamente que as estratégias sejam viabilizadas por meio das pessoas.
RH - Qual o maior desafio para se tornar um profissional de RH, principalmente no Brasil?
Marcelo Madarasz - Há competências cada vez mais importantes, entre as quais a flexibilidade e nisso o brasileiro ganha pontos. Embora isto que eu vá dizer seja aplicável a todas as áreas, vamos focar no profissional de RH: ele precisa investir fortemente em sua formação. Ouvi um dia do Firmin Antônio, na ocasião presidente e fundador do Grupo Accor no Brasil, que era necessário "RHlizar o negócio e negocializar o RH". Essa expressão foi fantástica, pois revelava o maior gap do profissional de RH: o desconhecimento e a falta de familiaridade com a estratégia do negócio. Se você quiser ser ouvido, do ponto de vista estratégico é fundamental entender do negócio, mergulhar no DNA da empresa para saber sua visão, missão, crenças ou valores, cultura, história e também o contexto mundial, local, mercado, saber interpretar indicadores e fazer uso deles estrategicamente. Na Natura, por exemplo, onde atuo atualmente como gerente de Desenvolvimento de Liderança e do Núcleo de Competências Essências e Estratégicas, o gestor precisa levar em consideração não apenas a dimensão econômica e financeira, mas também as dimensões sociais e ambientais para tomar qualquer decisão. Ou seja, na minha opinião, o maior desafio é ser um profissional diferenciado, que domine tecnicamente as competências necessárias para aquela organização, que conheça do negócio, do mercado, da estratégia, e que também tenha clareza de seu propósito de vida e seja coerente com ele. Não há um momento que se possa parar de investir em desenvolvimento, lembrando que nos desenvolvemos sempre no modelo 70/20/10. 70% no on the job, lidando com os desafios, 20% por meio de participação em projetos,coaching, mentoring e 10% em educação, seja presencial, seja virtual. Nunca deixar de aprender.
RH - Em sua opinião, quais as competências essenciais a um profissional de RH?
Marcelo Madarasz - Ser humano. Já reparou como muita gente está perdendo a dimensão humana? É a banalização do mal, o se acostumar ao que não faz bem. Um profissional de RH além de ser humano em sua dimensão mais profunda, amar as pessoas, querer genuinamente seu bem, deve estar a serviço. Deve saber servir, ter em sua missão a evolução da pessoa e da organização. Ele deve ser, às vezes, o elemento que denuncia quando algo não vai bem e propõe e implementa ajustes e correções de rota. Ele deve, muitas vezes, funcionar como o "bobo da corte" das peças de Shakespeare que tinham como ofício dizer a verdade ao rei. Nem sempre os líderes querem ouvir a verdade. O profissional de RH deve ser o guardião da verdade, da essência, daquilo que humaniza as organizações e, por outro lado, ter além do espirito de servir, o desapego de se fazer desnecessário à medida que os gestores assumam em sua função a arte de desenvolver pessoas, que por uma distorção do sistema acaba sendo delegado ao RH algo que é, ou pelo menos deveria ser parte nobre, fundamental e não delegável de cada gestor
RH - No seu caso, qual foi o obstáculo mais expressivo que o senhor enfrentou no início da sua carreira?
Marcelo Madarasz - Quando penso na fase anterior ao meu ingresso em RH, na área clínica, o maior desafio era me provar competente apesar da pouca idade. Comecei a trabalhar na equipe de um psiquiatra aos 18 anos, me formei com 21 e era comum escutar do paciente algo como: mas é você que vai me atender? Tem idade para ser meu filho ou neto... Era o desafio de se provar, além dos receios normais de quem está em início de carreira. Resolvi esta questão com a ajuda de pessoas mais experientes: a supervisão foi fundamental, além do investimento em formação. Na Gestão de Pessoas, o obstáculo maior inicial foi o desconhecimento do negócio. Eu vinha da área clínica e fui atuar numa metalúrgica. A forma para lidar com isto foi a honestidade e a humildade de mostrar que eu não sabia, mas que tinha profundo e genuíno interesse em aprender. Devo muito aos gestores com quem aprendi, mas também precisei fazer cursos que me capacitassem tecnicamente para o exercício do meu ofício. Além disso, de estudar para conhecer o negócio e como eu poderia contribuir, me orgulhava muito de conhecer os operadores da fábrica e de todos os níveis pelo nome. Aprendi com meu gestor a importância do olho no olho. Da confiança que só se faz presente com o convívio e com o verdadeiro sentimento de valorizar cada pessoa
RH - E seu ingresso na Natura, como ocorreu?
Marcelo Madarasz - Acredito ser extremamente valioso e importante você honrar tudo pelo qual você passou em sua vida, seja em sua vida particular, seja em sua vida profissional, apesar de saber que esta divisão é meramente didática, ou seja, a pessoa e o profissional são um só. Desta forma, minhas experiências anteriores ao ingresso em RH, nos hospitais psiquiátricos, nos grupos, como acompanhante terapêutico, fazendo teatro, atuando como professor, como coach, todas estas experiências me formam, fazem-me ser quem eu sou, da mesma maneira que a formação, os cursos, os relacionamentos, os marcos importantes de sua vida, as conquistas, as perdas, tudo que vivemos nos forma, nos faz ser quem somos. Depois da Thomson, trabalhei na Camargo Corrêa, outra grande escola e depois na Nokia, onde tive a oportunidade de conhecer e trabalhar numa empresa verdadeiramente global, presente em muitos países e que me exigiu lidar com várias culturas diferentes, pois eu tinha clientes internos que eram finlandeses, indianos, americanos, italianos, argentinos, portugueses, enfim, além da necessidade de conhecer a cultura da Nokia , a cultura finlandesa, saber lidar e respeitar esta diversidade é fundamental, aliás, diversidade não só de nacionalidades, mas também de diferentes modelos mentais. Eu atuava na Nokia, morei em Manaus e estava morando no Rio, quando recebi a proposta da Natura, que já era uma empresa que eu admirava profundamente, sabe aquele orgulho de ver uma empresa brasileira que é um case de sucesso? O convite era para fazer parte de um projeto que prepararia os líderes da Natura, para atuar no Brasil e em todas as outras operações. Era uma proposta muitíssimo atraente. Apesar disso, não foi fácil decidir, pois a Nokia também tinha um lugar especial no coração. Depois de um mês de reflexões e alguma angústia, já que escolher implica em perdas - já dizia Sartre que o homem é condenado à liberdade -, aceitei e mergulhei no Universo Natura, que confesso é um universo absolutamente encantador. Pude desenvolver um Programa de Formação de Líderes que teve dois anos de duração e de lá para cá pude atuar em desenvolvimento de lideranças, coaching, mentoring, programa de trainees, team buildings, relações alternativas de trabalho, engajamento, cultura. Meu foco atual faz parte do Núcleo de Desenvolvimento de Competências Essências e Estratégicas incluindo o Cosmos, nosso programa de desenvolvimento de líderes, programa este pelo qual sou absolutamente apaixonado. Tenho muito orgulho deste programa, da contribuição que ele tem não só para os participantes dele, mas para a organização.
RH - Qual a marca de Marcelo Madarasz nos trabalhos direcionados ao desenvolvimento de pessoas?
Marcelo Madarasz - Quando mencionei o propósito de vida, falei da possibilidade de contribuição ao desenvolvimento das organizações e pessoas. Uma marca que acredito eu tenha, seja a crença que é necessário ampliar o olhar. Como diria Saramago, para se ver , há de se dar a volta. Precisamos questionar os modelos mentais, ampliar o olhar e adoro fazer este convite para ampliação de repertório, seja esta ampliação viabilizada de onde vier ou por meio de quem for, ou seja, é necessário sim ter as competências técnicas fundamentais a cada profissional, mas é necessário ter repertório. A pior coisa é um profissional sem conteúdo, profundo como o pires (risos). Creio na arte como meio de sairmos da banalidade do dia a dia. Creio na arte como caminho de desenvolvimento. Desta forma uma marca seria o respeito e reverência a tudo que contribua para o desenvolvimento: as ciências, a filosofia, o cinema, o teatro, a poesia. É necessário termos genuíno interesse na evolução: nossa, do outro, do planeta, mas façamos isto com respeito inclusive ao tempo de cada um. Se cada um souber cuidar e limpar sua calçada, a rua estará limpa.
RH - Depois de tanto tempo dedicando-se o desenvolvimento de pessoas, o senhor ainda sente que falta algo para concretizar seus projetos profissionais?
Marcelo Madarasz - Sempre! Qual é o limite para a evolução? Não existe. Adoro o termo muito utilizado por Fernando Pessoa, que é inclusive título de um livro seu: O livro do desassossego. Tenho uma inquietação, um desassossego que me move. Ele pode até ser em alguns momentos fonte de angústia quando olhamos o mundo e não gostamos muito do que vemos. Mas a mágica é transformar este desconforto em algo que te mova a criar, a querer melhorar a si e ao seu entorno. As organizações estão doentes, muita gente que não se trabalha, não valoriza o autoconhecimento e o autodesenvolvimento e levam suas neuroses para a organização, que as acolhe e potencializa. Precisamos contribuir para que as empresas sejam foco de saúde e não de doença. O tema da minha tese de MBA foi "Sofrimento e Psicopatologias no Trabalho". Precisamos contribuir para a elevação do nível de consciência e este pode ser um diferencial importante para os profissionais de RH. Por meio de pessoas melhores, termos líderes melhores e empresas melhores. Precisamos nos preparar e preparar as nossas organizações para um novo modelo de se fazer negócio, um novo comportamento empresarial. Muito do que temos hoje é absolutamente insustentável. Evoluímos muito, chegamos a pontos interessantes, mas o que se tem para fazer é tanto... Aliás nem sabemos dimensionar o quanto ainda temos a percorrer
RH - Que avaliação o senhor faz dos últimos dez anos da Gestão de Pessoas, no Brasil?
Marcelo Madarasz - Lulu Santos cantou: assim caminha a humanidade: com passos de formiga e sem vontade.. .Não vou dizer que foi ruim, também não foi tão bom assim (risos). Muitas vezes recorro à música e à poesia para tentar responder minhas mais profundas inquietações. Na última década tanta coisa importante e fundamental aconteceu. Neste cenário a responsabilidade das empresas no todo também adquiriu proporções muito grandes, ou seja , se analisarmos as profundas mudanças econômicas, sociais desta década, seria absolutamente desejado e esperado do RH, ou de Gestão de Pessoas que acompanhássemos este ritmo. O próprio fato de, às vezes, utilizarmos a expressão RH, ou seja, Recursos Humanos e, às vezes, termos como Gestão de Pessoas, Capital Humano, Potencial Humano revela e denuncia o quanto ainda precisamos evoluir. Estamos em 2013 e ainda nos vemos e a nós nos referimos como recursos. Não seria esperado, à luz de toda evolução, que este tema singular já tivesse sido resolvido? Parece preciosismo, excesso de rigor, mas não é. Há inclusive certos modismos que denunciam uma certa fragilidade de nossa área. Quer um outro exemplo? É um símbolo, mas eles são extremamente importantes. Por que o salário de um diretor de RH é, na maioria das vezes inferior aos de outros diretores? Por que nem toda organização com porte que justificasse essa posição, tem um diretor de RH, mas às vezes um gerente? Será por ser uma posição menor? Não quero polemizar, mas quero fazer um convite para que possamos refletir sobre isso. Será que já conseguimos nos fazer ouvir no cenário estratégico? E se não o conseguimos, a culpa , ou melhor a responsabilidade é nossa. Quantos presidentes de empresas foram diretores de RH? Por que será que tão poucos? Ou seja, vamos honrar todas as conquistas ao longo da última década, nos orgulhar delas, mas reconhecer que ainda temos muito a percorrer
RH - Qual a sua expectativa para a área para os próximos anos?
Marcelo Madarasz - Toda vez que paro num farol e vejo uma pessoa parada, às vezes, balançando uma placa com propaganda de algum lançamento imobiliário, eu fico triste. Triste pelo fato de que ainda utilizamos o ser humano para funções como esta. Tenho uma expectativa, ou pelo menos um desejo que um dia esta pessoa que balança a placa no farol não seja mais necessária e que ela possa, então, estar dedicada verdadeiramente a algo mais condizente com a condição humana. Quando pensamos hoje em RH, temos uma gama tão grande de funções dentro da área, às vezes, um verdadeiro hortifrutigranjeiro que passa pela minha cabeça que seria maravilhoso se algumas dessas funções já tivessem encontrado uma saída mais inovadora e inteligente, que a tecnologia pudesse ter dado conta de nos aliviar de muitas coisas hoje burocráticas que ainda são realizadas pela nossa área. Isso poderia ser estendido não só ao RH, mas tomara que num futuro próximo aquele sonho de podermos nos dedicar a algo mais "nobre" que nos possibilite mais qualidade de vida, seja uma realidade. Que o RH deixe de ser RH para ser uma área de fomento à felicidade e ao bem-estar. Já pensou que máximo deixarmos de ser recursos? Mas enfim, vamos respeitar a evolução natural das coisas, sem com isso cruzarmos os braços e negligenciar a nossa responsabilidade. Sabe aquela máxima do Gandhi: "Seja a diferença que você quer ver no mundo?".
RH - Que conselhos o senhor daria para quem deseja torna-se um profissional de Recursos Humanos?
Marcelo Madarasz - A palavra conselho é perigosa. É como se a pessoa que se visse na posição de dar conselhos se julgasse superior (risos). Eu sempre repito uma expressão quando me flagro falando ou fazendo algo não muito bonito que estou me empenhando para ser um ser humano melhor, e seres humanos melhores exercitam a compaixão, não se julgam superiores, aceitam as pessoas como são, não se sentem superiores para dar conselhos. É brincadeira. O que eu gostaria de dizer às pessoas que queiram embarcar nesta trajetória é que é fundamental se conhecer, estar disposto a investir em seu desenvolvimento e querer servir. É fundamental encarar seu ofício como uma missão e que nem sempre terá o reconhecimento dos outros tal qual tão ardentemente sonhamos. Muitas vezes trata-se de uma atuação de bastidor, na qual embora você contribua muito para o sucesso da peça, no momento dos aplausos você não estará no palco para recebê-los. Você precisa ter clareza da resposta à pergunta: "Você tem fome de quê?". E ao obter esta resposta, ser coerente com sua missão servidora. Querer servir é fundamental e acreditar na sua possibilidade de contribuição para pessoas mais felizes, empresas melhores e consequentemente um mundo melhor. Como diria Terezinha Rios, uma filosofa e educadora brilhante, esta seria uma missão da melhor qualidade!
(*) Marcelo Madarasz
rh.com.br
Comunicação LCA Treinamentos & Consultoria
Nenhum comentário:
Postar um comentário