sábado, 10 de setembro de 2011

Estudo demais atrapalha?

Ana Paula,qualificação nos EUA não ajudou a conseguir emprego



A química Ana Paula Citadini, de 28 anos, de São Carlos, interior de São Paulo, planejava trabalhar na área de pesquisa e desenvolvimento na indústria farmacêutica, mas, quando terminou a graduação em química tecnológica pela Faculdade de Química e Bioquímica da Universidade de São Paulo há seis anos, sentia que estava pouco preparada para o mercado. “Pensei que, se emendasse uma pós-graduação ‘sanduíche’ (uma parte do curso no Brasil, outra nos Estados Unidos, na Universidade da Califórnia), sairia com um baita diferencial”, conta. Não foi o que aconteceu e hoje Ana Paula está à procura de emprego, mas com dificuldades até mesmo para ser chamada para as entrevistas. Nesse meio tempo, a profissional desenvolveu uma iniciação científica e estagiou dentro de laboratórios de universidades, aqui e no exterior. "O mercado se assusta com currículos acadêmicos superqualificados."
A consultora Sofia Esteves, presidente da Companhia de Talentos, consultoria de São Paulo que faz seleção de trainees e jovens profissionais para grandes empresas, analisou o currículo de Ana Paula. O problema é simples: na disputa por uma vaga, um candidato com boa graduação e três anos de experiência, por exemplo, tem mais chances que um com especialização, mas pouca experiência prática. “Há, entre os jovens, uma afobação em fazer faculdade, mestrado e doutorado, tudo emendado, imaginando que uma coleção de diplomas vai fazer com que sejam mais valorizados”, diz Sofia. Uma boa qualificação acadêmica tem peso, mas fica faltando a experiência, a capacidade de resolver problemas e as referências dos chefes.

Ana Paula percebeu que caiu no que os especialistas chamam de descompasso: passou do período ideal para conseguir uma vaga de trainee (geralmente acontece em até três anos após a graduação), mas ainda não acumulou experiência de mercado para competir por uma boa vaga em um nível mais alto da hierarquia, que faria jus ao seu doutorado em biofísica molecular.

EMPRESAS EXIGEM Em partes, esse tal descompasso é o resultado do alto grau de exigência das empresas quando anunciam suas vagas com exigências de superqualificação, e passam a impressão de que, quanto mais cursos no currículo, melhor. Márcia Fernandes Kopelman, diretora de relações humanas da Promon Engenharia, de São Paulo, faz a mea-culpa dizendo que, ao fazer uma lista grande de requisitos, as companhias evitam problemas no futuro. “Muitas vezes a empresa está considerando a possibilidade de o profissional precisar daquela competência no futuro”, afirma Márcia.

Outro “estímulo” a essa ansiedade por mais formação vem do mercado de educação executiva, que cresce cerca de 20% ao ano no país e lança cursos cada vez mais segmentados. “O que se vê hoje no Brasil é a criação de cursos nomeados MBAs que vão de moda a terapia ocupacional”, diz Ricardo Betti, sócio-diretor da MBA Empresarial, de São Paulo, consultoria que auxilia executivos a escolher o curso mais adequado (no Brasil, diferentemente dos Estados Unidos e da Europa, o MBA não é um mestrado, mas um curso de pós-graduação que deve ter um mínimo de 360 horas, e não tem a mesma regulamentação que mestrados e doutorados). “Há uma proliferação de cursos que fogem da proposta original do MBA: formação generalista em gestão de negócios”, diz Ricardo. Com isso, os profissionais acabam fazendo diversos cursos, muitas vezes na mesma área, já que há novos nomes mais especializados a cada ano.

Entre as 7 329 pessoas que responderam à pesquisa da VOCÊ S/A, só 14% tiveram promoção após a especialização ou MBA


TURBINAR O CURRÍCULO
O engano de melhorar o currículo sem objetivo claro, a não ser o de parecer mais qualificado, é comum mesmo nas altas esferas das empresas. “Fico perplexa com a quantidade de cursos que os executivos fazem apenas para levar o certificado, sem se preocupar com o que aprenderam de fato”, diz a headhunter Fátima Zorzato, presidente da consultoria Russell Reynolds no Brasil, de São Paulo. “A capacidade de estabelecer uma boa rede de conhecidos pode valer mais do que anos de estudo.  Estabelecer metas para a carreira ajuda a não cair no conto dos MBAs superespecializados, ou em escolas pouco qualificadas.

“O profissional deve se perguntar aonde quer chegar e planejar o que é preciso para ganhar uma promoção”, diz Adeildo Nascimento, diretor de recursos humanos da operadora de telefonia GVT, com sede em Curitiba, no Paraná. Uma deficiência de formação é mais facilmente suprida do que falta de experiência, o que faz crer que investir em desenvolvimento pode valer mais do que fazer cursos.

“Durante uma seleção você pode convencer que é o melhor para a vaga, mesmo sem reunir todos os requisitos acadêmicos, mostrando sua capacidade de realizar”, diz Márcia, da Promon. “Curso de ponta é um diferencial, mas deixou de ser sinônimo de ascensão rápida”, diz Leyla Galetto, headhunter da Yod Dextrom. Uma prova é que a pesquisa do Guia VOCÊ S/A – Os Melhores MBAs no Brasil deste ano mostrou que apenas 14% dos 7 329 participantes tiveram promoção após a conclusão do curso. Não é que MBA deixou de ser importante, mas a capacidade de realizar mudanças em uma empresa conta mais do que um currículo acadêmico superturbinado.


Por: Bruno Vieira Feijó

vocesa.com
Comunicação LCA Treinamentos & Consultoria

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